Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

domingo, 20 de janeiro de 2013

Certamente...

Hoje, 20 de Janeiro de 2013, passam quarenta anos sobre o assassinato de Amílcar Lopes Cabral, tinha 48 anos, líder do PAIGC, Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde, um homem de rara inteligência, que a humanidade reconhece e se sente premiada pela estatura invulgar de personalidades como Amílcar Cabral.

Passaram quatro décadas, é pacífico para todos quem foi o autor material deste hediondo atentado, mas o mesmo não acontece para quem o idealizou, aquele que, prometeu algo em troca deste crime.

Recentemente, duas figuras públicas, ambas cabo-verdianas, vieram tomar posições, que eu não afirmo antagónicas, mas sim diferentes, sobre a morte de Amílcar Cabral. O antigo presidente da República de Cabo Verde Pedro Verona Rodrigues Pires, o comandante Pedro Pires, afirma que foi obra de Portugal e dos portugueses, para manter o império colonial, por outro lado, o actual Primeiro-Ministro de Cabo Verde, José Maria Pereira Neves, acusa o PAIGC pela autoria do crime.

Amílcar Cabral sabia bem o percurso que trilhava e também sabia que a luta na Guiné Bissau era uma semente para a verdadeira libertação dos povos africanos, principalmente os da região onde o seu país estava inserido. Recordemos algumas palavras sempre actuais que ele tão bem exprimia:

”Os camaradas já compreenderam bem o que é o povo. O problema que pomos agora é o seguinte: Mas o nosso povo está a lutar contra quem? Claro que a luta dum povo é sua, de fato, se a razão dessa luta for baseada nas aspirações, nos sonhos, nos desejos de justiça, de progresso do próprio povo, e não nas aspirações, sonhos ou ambições de meia dúzia de pessoas, ou de um grupo de pessoas que tem alguma contradição com os próprios interesses do seu povo.

Contra quem é que o nosso povo tem que lutar? Desde o começo nós dissemos claramente. Nós, como colónias de Portugal na Guiné e em Cabo Verde, somos dominados pelo estrangeiro, mas não são todos os estrangeiros que nos dominam e, dentro de Portugal, não são todos os portugueses que nos dominam.

Aquela força, aquela opressão que está a ser exercida sobre nós, vem da classe dirigente de Portugal, da burguesia capitalista portuguesa, que tanto explora o povo de Portugal, como explora o nosso povo. E, como sabemos bem, a classe dirigente de Portugal a classe colonialista de Portugal, está ligada à dominação do mundo por outras classes doutros países, formando juntas, a dominação imperialista. Está ligada ao conjunto das forças capitalistas do mundo que, dominando os seus próprios países, têm necessidade vital de dominar outros povos, outros países, tanto para terem matérias-primas para a sua indústria, como para terem mercados para os seus produtos. Por isso, nós somos dominados pela classe capitalista colonialista portuguesa ligada ao imperialismo mundial.

O nosso povo está, portanto, a lutar contra a classe colonialista capitalista portuguesa e, lutando contra ela, está a lutar necessariamente contra o imperialismo, porque ela é um pedaço, embora pequenino e mesmo podre, do imperialismo. Assim, nós sabemos contra quem é que lutamos.”

E Amílcar Cabral ainda acrescentava:

“E, nessa base, vemos logo que a nossa luta não pode ser só contra estrangeiros, tem que ser também contra alguma gente dentro da nossa terra. O nosso povo tem que lutar ao mesmo tempo contra os seus inimigos de dentro. Quem? Toda aquela camada social da nossa terra, ou classes da nossa, terra, que não querem o progresso do nosso povo, mas querem só o seu progresso, das suas famílias, da sua gente.”

A luta encetada por Amílcar Cabral contra o colonialismo português era a mesma que a população portuguesa já travava contra o fascismo e todos sabiam, em Portugal, na Europa, na América e precisamente no centro do conflito, em África, que o domínio português começava a colapsar na Guiné.

Amílcar Cabral era um amigo de Portugal e dos portugueses e os dirigentes sabiam que ele seria um interlocutor, para quando tudo tivesse perdido, haver uma ponte de diálogo. Interessaria a Portugal a morte de Amílcar Cabral? Certamente que não!

O PAIGC tinha um líder que enraizava todos os saberes de duas culturas tão diferentes, mas também tão iguais, como a cabo-verdiana e a da guiné, estaria interessada na sua morte? Não certamente!

Então…Porquê?

A realidade tem-nos dado pistas para ajudar a compreender o que se passou naquela noite de 20 de Janeiro de 1973. Foi a primeira de muitas mortes que se têm verificado nestes últimos quarenta anos na Guiné Bissau, sempre com a responsabilidades divididas entre, num nível superior, portugueses e guineenses, num patamar intermédio, cabo-verdianos e guineenses e por fim num degrau inferior, etnias combatendo entre elas.

Na verdade, tudo não passa de cenários criados na divisão que Amílcar Cabral referia, mas o autor material do crime, continua impunemente a jogar no tabuleiro internacional e ainda hoje, 20 de Janeiro de 2013, tenta não perder, o espaço estratégico que durante muitos anos alcançou. Baía da Lusofonia

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