Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Historiador


“Nos idos tempos de minha juventude, o radicalismo político era indiscutivelmente vermelho, nas suas várias tonalidades; do rubro encarnado do livrinho de pensamentos do presidente Mao até o rosa choque da social-democracia. As velhas tias baianas desenvolveram uma sábia teoria, pela qual comunismo era como surto de sarampo. Era normal na infância e muito perigoso na maturidade! Hoje, o radicalismo mudou de cor. Ele é indiscutivelmente verde, em todas as suas tonalidades; do verde-oliva dos defensores da floresta, ao verde-musgo dos defensores das águas, até o verde- claro dos defensores do ar puro e do clima fresco.

Para que meus amigos verdes não fiquem verdes de raiva, devemos reconhecer que o radicalismo é da natureza dos movimentos sociais. Cada movimento existe em função de uma pauta específica, focada em uma questão que assegura a legitimidade e a militância de todos os seus simpatizantes. Por isso os movimentos sociais são sempre maximalistas. Assim é que os governos são de partidos políticos e não de movimentos sociais.

O mais grave é que os radicalismos nunca andam sós. Ao lado do verde infantil, anda o saudosismo senil. Nós todos, pós-sexagenários, sentimos bater em nossas mentes a saudade de nossa própria juventude. “No meu tempo tudo era melhor”. Ai que saudade tenho da Estância Hidromineral de Dias D’Ávila, veraneio de toda a minha infância. Nunca mais os banhos das milagrosas lamas preta e branca, nunca mais a cata de mangaba nos tabuleiros… ai que saudade! Mas nem por isso pretendo destruir o Polo Petroquímico, principal atividade industrial da Bahia. Esta patologia tem hoje um sintoma: a saudade da Itaparica do meu avô! Como diz o povo, amor que fica é amor de Itaparica!

A mais recente manifestação deste encontro de radicalismos é a oposição apaixonada ao projeto de construção da ponte Salvador-Itaparica. Este não é um projeto rodoviário isolado. Ele faz parte de todo um planejamento do Estado da Bahia para a reativação da Baía de Todos os Santos e seu entorno, o Recôncavo Baiano. Esta baía nunca foi um local bucólico de contemplação e sim um local de trabalho produtivo! O desafio do presente é a restauração do desenvolvimento articulado de toda a baía, com indústria naval, interligação de estradas com o sistema de portos e expansão da indústria automobilística e do Polo Petroquímico.

A baía bucólica é o triste resultado das mudanças econômicas dos anos 60, com o funcionamento da Rio-Bahia e com a implantação da economia do petróleo, que produziram um Recôncavo desenvolvido, chamado Região Metropolitana de Salvador, e um Recôncavo abandonado, chamado de Histórico. Nestes espaços abandonados, ficou uma população pobre, os nativos, sem acesso aos serviços de saúde, educação, sem emprego e sem rendas, indigentes das migalhas dos ricos veranistas e turistas do Recôncavo desenvolvido, que durante algumas semanas no ano, iam descansar as vistas com a pobreza alheia. Na Baía do século XXI, tanto nativos quanto veranistas tem o mesmo direito de acesso aos benefícios do desenvolvimento, pois são todos cidadãos baianos.

O grande remédio contra os radicalismos é a prática da democracia. Que todos os interessados sejam ouvidos! Que se defina a justa medida da preservação da cidade de Itaparica, cidade histórica e estância hidromineral, de modo a protegê-la dos impactos negativos da desfiguração urbana e da implacável especulação imobiliária. Queremos todos que a cidade de Itaparica continue a produzir milagres com a sua água fina, que faz velha virar menina.“

Com o título “Radicalismo e Desenvolvimento” escreveu Ubiratan Castro de Araújo no dia 07 do passado mês de Outubro o seu último texto no blogue que era o autor “Blog do Bira Gordo”. Aí podemos ler uma pequena biografia que passo a citar: “Nascido em Salvador, em 22 de dezembro de 1948, Professor Doutor Ubiratan Castro de Araújo exercia, desde 2007, o cargo de diretor-geral da Fundação Pedro Calmon, unidade da Secretaria de Cultura do Governo da Bahia.

Doutor em História pela Université Paris IV-Sorbonne, Mestre em História pela Université Paris X-Nanterre, Licenciado em história pela Universidade Católica do Salvador e Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Bahia. É membro da Academia de Letras da Bahia, onde ocupa a cadeira 33, cujo patrono é o poeta abolicionista Castro Alves.

É professor da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Ufba. Foi diretor do Centro de Estudos Afro-Orientais da Ufba (CEAO), presidente do Conselho para o Desenvolvimento das Comunidades Negras de Salvador (CDCN) e é Irmão Professo da Venerada Ordem do Rosário de Nossa Senhora dos Homens Pretos a Portas do Carmo, localizada na Igreja do Rosário dos Pretos no Largo do Pelourinho.

No primeiro mandato do presidente Luís Inácio Lula da Silva (entre 2003 e 2006), Ubiratan Castro de Araújo trabalhou com o ministro da Cultura, Gilberto Gil, presidindo a Fundação Cultural Palmares. Desde 2007, integra o Governo Jaques Wagner, sendo diretor-geral da Fundação Pedro Calmon, unidade da Secretaria Estadual de Cultura.

Entre os prêmios e títulos que recebeu, destacam-se: a Medalha do Bicentenário da Restauração Portuguesa da Academia Portuguesa de História, o Troféu Clementina de Jesus da União dos Negros pela Igualdade (Unegro), a Medalha Zumbi dos Palmares da Câmara Municipal de Salvador e, a mais recente, a Comenda da Ordem Rio Branco, condecoração oferecida pelo Ministério das Relações Exteriores do Brasil. É autor dos livros: A Guerra da Bahia, Salvador Era Assim - Memórias da Cidade, Sete Histórias de Negro, o primeiro trabalho ficcional do autor e Histórias de Negro (versão ampliada).”

Enquanto presidente da Fundação Cultural Palmares, Ubiratan Castro de Araújo projectou o Brasil na assunção  do debate sobre a diáspora africana, com a realização de diversos encontros históricos, como a II Conferência de Intelectuais da África e Diáspora (CIAD) e apoiando o presidente Lula da Silva nas viagens ao continente africano, a chave mestra na oportunidade para um maior relacionamento Brasil – África. Baía da Lusofonia

                Em memória de Ubiratan Castro de Araújo, Salvador (Brasil)

                                                   22.12.1948 – 03.01.2013

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