Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Uno, duo ou trino

Um subproduto de deus é a certeza. Não levamos bem que não haja nada debaixo dos pés. Talvez por isso a ciência véu a ocupar em muitas pessoas o lugar deixado por deus. Disto não se livra, porque o havia de fazer, a língua.

É habitual nos procelosos debates internáuticos atacar a pouca cientificidade de uma afirmação ou apelar à Filologia como um Salomão do século XXI a dirimir se A é B são, ou não, entidades diferentes. Pobre filologia, invocada para resolver o que não pode. Pobres filólogos requeridos como popes para dar a sua bênção. Bom, nem tão pobres que alguns adoram o papel, seja dito de passagem. Deve ser difícil renunciar ao poder das togas.

Nas últimas semanas várias músicas vêm à minha cabeça. Parece que mudei de tema mas apenas o parece, um bocado de paciência. Vou a caminhar e o Spotify da minha cabeça canta: “Eu sou um rapazinho, Embora pequenino, Tenho muito tino, Sou o Ruca”. Passado um tempo a playlist deixa sair “olá amigo, já estamos aqui, somos os caricas, vamos brincar”. Se não bastasse, a seguir soa: “Fum ao mercado comprar café e a formiguinha picou-me no pé”. Enfim, é o que che tem ser pai. Como? Que mudei de tema? Não, vais ver que não.

Deixávamos atrás aos filólogos salomônicos, com as suas togas e as suas espadas a decidir se galego e português e brasileiro são Uno ou Trino ou Duo. Que tal se deixamos passagem aos sociólogos, aos politólogos, aos economistas, aos programadores culturais, aos músicos, aos encenadores e a tantos outros opinarem sobre o tema? Que tal, ainda melhor, se perguntamos aos galegos e as galegas como vivem as sua língua? Uns como zero, outros como uma vaga companhia, outros como o eco das aldeias, outros como o crisol da nação galega “só para nós”, outros como uma vantagem curricular, outros como o universo em que querem educar os seus filhos para além dos limites que nos inculcaram, a incluir o Brasil, Angola ou Portugal. E todos vivemos no mesmo país. Pobre Salomão. Valentim Fagim – Galiza in “Portal Galego da Língua”

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