Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

domingo, 6 de maio de 2018

Cançoneta do Forte Fraquinho

















Vamos aprender português, cantando


Vou correr o mundo inteiro,
vou seguir o teu luzeiro,
neste meu pobre batel.

É destino de quem ama,
ser actor num melodrama
num romance de cordel.

Eu passo horas a fio
a ensaiar um assobio
e tu nunca me sorris.

Vou escrever um poema,
vou inventar um cinema:
um filme com um final feliz.

Vou dar a volta ao meu fado,
vou-me fazer engraçado,
para acender o teu sorriso.

Vou dar a volta ao destino,
vou até fazer o pino,
talvez perdendo o juízo.

Por ti sinto um arrepio,
vou fundear meu navio
no cais da tua indiferença.

Faço tudo o que quiseres,
até pesos e halteres,
que isto é quase uma doença!

Sombra, cinza, solidão,
por dentro da minha canção,
Do, ré, mi, fá, sol, lá, si.

Vou cantar muito baixinho,
este tão forte fraquinho
que me faz correr por ti...

Hei-de ser muito cortês,
com piano e francês,
vou aprender a dançar.

Vou comprar um papillon,
rasgar noites de néon
para acender o teu olhar.

Dou um jeito no sotaque,
que não sou nenhum basbaque,
que não sou um gabiru.

Aprendo a ter maneiras,
canto em línguas estrangeiras,
oh mon amour, I love you!

Agora tenho um palpite:
vou pertencer à elite
de poetas e pintores.

Mesmo sem ser o Picasso,
vou melhorar o meu traço,
hei-de inventar novas cores.

Quero pintar num retrato
o teu gesto tão gaiato,
tão suave como a brisa.

Quem sabe se, felizardo,
hei-de ser o teu Leonardo
e tu a minha Mona Lisa.

Sombra, cinza, solidão,
por dentro da minha canção,
Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si.

Vou cantar muito baixinho,
este tão forte fraquinho
que me faz correr por ti...

O teu amor é incerto
e eu quero ficar mais perto
do teu olhar tão distante.

Vou quebrar esta lonjura,
cavalgar a noite escura,
como um cavaleiro andante.

Hei-de ser um menestrel
a imitar o Jaques Brel,
numa valsa sem ter fim.

Vou-te ofertar minha lira,
e mesmo que seja mentira
diz-me que gostas de mim...

Sombra, cinza, solidão,
por dentro da minha canção,
Dó ré mi fá sol lá si.

Vou cantar muito baixinho,
este tão forte fraquinho
que me faz correr por ti...

José Medeiros - Portugal



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